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David Lynch é um realizador
com os pés bem assentes no chão mas
sempre com aquela cabeça a viajar por
galáxias distantes. Não será por acaso que deixa um rasto de destruição sempre que manda
cá para fora mais uma das suas grandiosas excentricidades.
Será que o pessoal já se esqueceu da série Twin
Peaks que pôs meio mundo com os neurónios colados ao teto a tentar descobrir o assassino de Laura Palmer? E, se
calhar, tudo isso para nada, porque a rapariga ainda deve andar por aí. Tal
como o Elvis e o Morrison. Já agora, o Cobain, o Hendrix e o Michael Jackson. Andam todos por aí, cantando
e rindo às nossas custas. Peço desculpa,
ainda estou meio influenciado pelo filme que acabei de rever e já nem digo coisa com coisa.
Meus amigos, Mulholland
Drive ultrapassou todos os
limites. David Lynch é cruel e vai
gozando, descaradamente, com a
nossa cara. A história é super enigmática e, para quem não teve a coragem de a abordar, vou deixar aqui
um ligeiro cheirinho para aguçar o
apetite dos meus camaradas “psico-masoquistas“
que , tal como eu, adoram
torturar os seus indefesos cérebros.
Mas assim seria fácil demais. Vou reformular o parágrafo
anterior. Aqui vai um flashback.
Tudo começa quando a canadiana Diane
chega a Los Angeles com o sonho de se tornar numa atriz famosa e conhece por acaso Rita, que está num estado lastimável, após ter sofrido um grave acidente em Mulholland Drive. Quem é que chega a Los Angeles? Betty ou Diane?
Deu para entender a complexidade da coisa? Mas isto são “peanuts” se compararmos com a imensidão de perplexidades que nos vão surgindo pela frente. O momento
zero de todas estas anormalidades surge
no fatídico instante em que Diane adormece. Temos de estar emocionalmente bem preparados para não darmos trabalho aos nossos familiares.
Acreditem que isto é só um aviso! O ambiente descarrila a sério e torna-se assustadoramente sombrio, culminando
numa série de incongruências, delinquências e extravagâncias que nos deixam
completamente apáticos e sem a mínima capacidade
de reação.
Todos sabemos que a arte e a loucura andam muitas vezes
de mãos dadas mas, quando chegamos ao misterioso “Clube Silêncio“, ficamos com a estranha
sensação que David Lynch só podia andar
a fumar alguma erva rara que o pôs completamente desvairado. O mais grave é ele pensar que a melhor forma de transmitir o seu
desnorte é fazer o espetador partilhar
as suas alucinações.
Rebekah Del Rio, com
aquela sobrenatural interpretação do tema
Crying de Roy Orbison deixa qualquer um em estado de choque. Betty e Rita não resistiram e foram-se abaixo de forma
arrepiante. Verdade seja dita, nem a Ágata nos seus melhores dias conseguiria uma
performance tão poderosa.
Enfim, talvez seja melhor ficar por aqui. Quem pensa que
pode acabar de ver o filme e sair tranquilamente para tomar um cafezinho, pode
tirar o cavalinho da chuva. Mulholand
Drive é uma assombração que vos
irá perseguir durante uns tempos. O universo “Lynchiano“ está infestado de
perigosas armadilhas e não pode ser enfrentado de peito aberto. Eu armei-me em
esperto e acabei por pagar bem caro a
ousadia.
Andei uma temporada a viver numa espécie de campo
metafísico, situado algures entre a
realidade e o sonho. O medo tomou conta
de mim . O simples gesto de ligar a televisão era suficiente para apanhar cada cagaço que nem é bom pensar. No início aparecia-me
a Teresa Guilherme aos berros e
outras vezes a Júlia Pinheiro a relinchar . Depois era aquela aberração chamada Manuel Luis Goucha com umas vestimentas super
reluzentes e a sua amiga a guinchar. Um verdadeiro
pesadelo.
Como se pode ver, pensem duas vezes antes de embarcarem nesta viagem sem regresso. Tenho cá um
palpite que nem nos vossos sonhos mais loucos conseguirão descobrir se o enredo anda à volta de duas amigas que se
transformam em amantes, de duas amantes
que se transformam em inimigas ou se nem uma coisa nem outra.
Vida de cinéfilo não é fácil...
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